12/09/2015

2 Emigrantes Portugueses e os refugiados

Encontramos 2 relatos no Facebook, de 2 emigrantes portugueses, o Pedro na Austria, e a Alexandra na Suécia, que achamos extremamente pertinentes, abordando a questão dos refugiados.

O Pedro, mora num país conhecido por ter uma população das mais xenófobas da Europa ... A Alexandra, na Suécia, trabalha com refugiados Sírios.

Publicamo-los aquí na integra :


PEDRO - AUSTRIA

"Vivo num país, a Áustria, supostamente "nazi" e xenófobo, dito principalmente por pessoas que nunca viveram aqui. Neste país, passaram nos ultimos dias mais de 20 000 refugiados. Foram doadas 27 000 toneladas de comida, roupa e brinquedos.

Todos os dias são organizadas excursões de carros particulares para ir aos "campos" de refugiados da fronteira entre a Sérvia e a Hungria ajudar com comida, medicamentos, roupa, etc.

Quando os refugiados não podiam sair de Budapeste, 150 carros particulares foram lá buscá-los, arriscando multas e mesmo prisão.Em nenhum momento houve um único incidente. Nem austríacos atacaram refugiados, pelo contrário, nem vice-versa. Zero. Há videos a circular de escaramuças, entre os húngaros que os maltratam e os refugiados. Não entre os austríacos e refugiados, porque aqui foram bem recebidos.

No meu mural do Facebook, houve ZERO publicações anti-refugiados vindas dos amigos austríacos ou a viver na Aústria. Nem sequer o "eu não me importo que eles venham, mas...". Não há mas, se são refugiados.

No entanto, do país onde nasci, o país dos brandos costumes, o país sempre a vangloriar-se de receber tão bem estranhos, estrangeiros, vejo no mural do meu facebook inúmeras publicações xenófobas e ignorantes, para dizer o mínimo, e pessoas que vão a manifestações anti-refugiados, assim mesmo, cheias de orgulho.

Neste momento, sinto orgulho de viver na Aústria
e vergonha de alguns dos meus compatriotas."

Pedro Carvalho 
ALEXANDRA - SUÉCIA
"É incrível como de entre todos os amigos que tenho um pouco por todo o mundo, os portugueses são os únicos que andam desde o fim-de-semana a publicar barbaridades (textos e fotos) sobre os refugiados. Porque será? 
Ignorância? Medo? Falta de informação correcta? Francamente, gostava de convidar todas estas pessoas que estão tão fora da realidade, que tudo o que conhecem parece ser o que é veiculado pelas redes sociais, a passarem 24 horas comigo, no meu trabalho, na Suécia.

O meu trabalho diário é ser mãe, pai, irmã, amiga, tutora, psicóloga de jovens e crianças vindas de países em guerra como a Síria, o Afeganistão, a Eritreia, a Somália, a Etiópia e muitos outros... Crianças que tiveram a sorte que muitas outras não tiveram… A sorte de ter familiares com algumas posses que venderam tudo para as salvar... Muitos dos jovens vindos da Síria são filhos de académicos, médicos, dentistas, engenheiros, advogados, que venderam tudo o que tinham para pôr os miúdos naqueles barcos que se vêem todos os dias na televisão, sujeitando-os a riscos tremendos, mas ainda assim menores do que aqueles que correm lá. 
 
Fizeram-no com a esperança de que eles pudessem ter uma nova vida em paz na Suécia. Mas, mesmo aqueles que sobreviveram à viagem, mesmo os que encontram um país acolhedor e em paz, continuam a trazer dentro de si a guerra, o trauma. O trauma. O trauma. Estas crianças dormem 3 horas por dia porque têm medo de adormecer, porque têm terror dos pesadelos que têm. As crianças sírias, por exemplo, não sabem sequer se os pais, que ficaram na Síria, estão vivos, pois já nem a internet funciona lá. Imaginem a angústia em que vivem.

Todos os dias entram 40 jovens refugiados na cidade de Malmö e a Suécia, no seu todo, já permitiu a entrada de 100.000 refugiados... Sim, a Suécia ainda é um país onde o humanismo existe. Ajudámos em 1992, na Guerra do Báltico e isso não nos prejudicou em nada… pelo contrário! Hoje o meu dentista e o medico da minha filha são ex-refugiados muçulmanos!

Agora ajudamos a Síria porque é a Síria que precisa de ajuda. O sangrento conflito que a assola já se arrasta há mais de dois anos e meio e tornou-se uma das piores crises humanitárias em décadas recentes. Mais de metade da população existente na Síria antes da guerra está agora em situação de carência de assistência humanitária para assegurar a sua sobrevivência.

O sofrimento causado pela violência na Síria é particularmente devastador para as crianças, que são expostas ao trauma e ao isolamento. Mais da metade delas perdem a oportunidade de frequentar a escola e muitos são forçados a trabalhar para ajudar a sustentar as suas famílias. A Síria está em risco de perder uma geração inteira e, com ela, o futuro, porque as crianças de hoje serão os adultos que poderiam reconstruir seu país quando um dia a paz voltar à Síria.

Mais países precisam de seguir o exemplo e estabelecer sistemas de protecção semelhantes aos da Suécia e da Alemanha. São demasiadas as pessoas deslocadas que perdem a vida a tentar atravessar o Mar Mediterrâneo, como todos vimos recentemente com os naufrágios ao largo da ilha italiana de Lampedusa. 
Muitas outras são exploradas por traficantes nas suas tentativas de chegar à Europa através das fronteiras terrestres. Há algo de fundamentalmente errado num mundo onde as pessoas que procuram em desespero um refúgio da violência e do conflito são forçadas a expor-se a riscos como estes que ameaçam as suas vidas.

É preciso garantir-lhes a segurança de outras maneiras, encontrar outras vias de transporte que não as ponham à mercê de traficantes, providenciar o reagrupamento familiar, o reassentamento, assegurar melhores condições de acolhimento e de asilo.

Escolher entre sermos solidários ou ficarmos em passividade é algo que para mim não está aberto a discussão. As gerações futuras vão olhar para trás e vão fazer o seu julgamento de todos aqueles que tinham os meios para aliviar o sofrimento humano e da determinação que empenharam nisso. A Europa - toda a Europa - deve fazer melhor. Tenho o orgulho de ser uma das pessoas que contribui para que os refugiados tenham uma vida melhor e sinto que por isso sairei incólume desse julgamento.

Mas entristece-me ver a radicalidade e a generalização desinformada de alguns dos meus amigos portugueses, que diariamente publicam posts ignorando completamente a realidade das pessoas que abandonam os seus países fugindo à guerra. E não falo apenas das crianças, que são as que mais sofrem, mas de colegas e amigos muçulmanos (e que honra é ser amiga deles) que são pessoas extraordinárias, cultas e muito educadas e que fugiram para cá, apenas para poderem ter uma nova oportunidade de viverem em paz.

Estou indignada e triste com a ignorância que estas pessoas exprimem, escondidas atrás de um computador, como se fossem grandes especialistas da matéria. Neste momento, o meu trabalho está numa situação de sobrecarga. Chegamos a trabalhar 15 horas por dia para dar uma resposta cabal ao que nos é exigido e estamos psicologicamente exaustos com tanto trauma e sofrimento com que temos de lidar, mas ao fim do dia eu sei que fiz a coisa certa, que ajudei quem precisa. E o que lamento é que tantos portugueses ignorem que, apesar de todo o esforço exigido, o meu trabalho é um privilégio, que conhecer diferentes culturas e histórias de vida é uma oportunidade para crescer individualmente. É um enriquecimento extraordinário. E é muito gratificante saber que nós, os que recebemos os refugiados e os ajudam a ter um futuro, estamos a deixar um mundo melhor às gerações que se seguirão.

Há que fazer uma diferença entre os extremistas, terroristas, fundamentalistas e os desgraçados dos muçulmanos que estão a fugir destes assassinos! Só porque existem padres católicos pedófilos não quer dizer que todos os padres católicos são pedófilos!"

“You can not use the media if you want to understand the world you have to have a world image that matches....."

Alexandra Capelao Ratell