Para
os interesses financeiros trata-se da forma preferida, de impôr os
preços que lhes tragam mais vantagem, em função das condições do
mercado, da evolução das produções ou até para fazer face a
situações geoestratégicas de conveniência.
Para
aqueles leitores, para quem tudo isto é nebuloso, deixo aqui um
exemplo real que eu conheci por perto, e que retrata perfeitamente,
embora com algumas nuances,
o funcionamento deste mercado.
A
década de 70 foi a altura em que a fruticultura se mecanizou e se
plantaram pomares de pera e maçã, com alguma extensão; como as
organizações de produtores eram incipientes, quem dominava o
circuito comercial da fruta eram os chamados “intermediários”;
compravam a fruta aos produtores, armazenavam-na em frigoríficos e
forneciam o mercado de acordo com a procura e muitas vezes com alguma
especulação.
Mas o que está aqui em causa é outra coisa; dada a necessidade de muitos agricultores de realizarem dinheiro cedo, os pomares eram adquiridos pelos “intermediários” ainda na fase de crescimento da fruta, por alturas de Maio a Junho; nessa altura a colheita era uma simples promessa; então celebravam-se contratos de futuro mais ou menos pormenorizados. O agricultor tinha uma garantia que vendia a fruta, recebendo um sinal à data do contrato; o intermediário assegurava-se que tinha fruta para comercializar.
Até
aqui tudo bem, a não ser num pequeno ponto: uma das partes, o
“intermediário”, estava normalmente muito mais bem informada
acerca das produções gerais dessa fruta do que o agricultor, o que
lhe permitia gerir especulação positiva ou negativa em seu
proveito. Quem dominasse a tendência da evolução do preço da
fruta ao longo daqueles meses, podia ganhar muito dinheiro. Hoje,
este tipo de negócio é marginal, pois o comércio no retalho foi
dominado pelos Hipers, e os produtores ou têm dimensão razoável ou
estão agrupados.
Continuando.
Os contratos de futuros fazem-se a nível internacional, com muitos
produtos; experimentemos pois perceber acerca dos que são
contratualizados no sector do petróleo e cuja manipulação dos
preços permite ao sector financeiro e especulativo arrecadar gordos
proventos.
Há
companhias multinacionais produtoras de petróleo; há companhias de
bandeira que também o fazem. A oferta tem muitas origens, é
diversificada em termos de qualidade e também de custo de produção;
e como em todos os negócios, há quem tenha sempre muita urgência
de vender. Do lado da aquisição estarão as companhias com
capacidade de refinação e os chamados brokers,
estes muitas vezes ligados aos interesses financeiros. As companhias
de refinação necessitam de ramas em contínuo, pelo que precisam de
as adquirir ao firme com bastante antecedência, para que na data em
que delas necessitem, fazer o seu processamento industrial.
Os
brokers fazem aquisições, com o intuito de vender ao melhor preço.
Todos necessitam de as obter ao melhor preço possível. Não vou
aqui complicar com riscos cambiais e swaps, pois o que interessa é
percebermos a questão da essência do problema económico. Em resumo
os adquirentes firmam contratos de futuros, em que são pagos à
cabeça determinada percentagem como sinal garante do fornecimento de
ramas em determinada data.
Esse
contrato de futuro constitui-se como um título negociável; num
mundo carente de energia fazem-se muitos contratos destes
diariamente. Que se negociados numa bolsa de valores, podem
constituir importante fonte de receita financeira, para as partes
mais bem informadas do mercado; e constituir-se como um meio de
imposição de preços no mercado através de movimentos
especulativos, tanto na subida como de descida. Pois os preços
praticados neste mercado secundário passam a servir de preço de
referência para o mercado primário.
E
é nesta fase que se dão as especulações positivas e negativas;
poderes financeiros com capacidade financeira suficiente podem subir
ou descer os preços artificialmente, dependendo do seu interesse.
Se
a cotação do petróleo subir acima do valor inicial acordado no
contrato de futuro, faz com que o título suba de valor, pois quem o
tem, possui um ganho potencial, na aquisição da mercadoria no final
do prazo; se a cotação do petróleo descer, o valor expresso no
contrato faz com que o titular deste tenha uma perda potencial no
final do prazo. Num caso, o possuidor do título poderá querer
vendê-lo para realizar mais-valias, no outro também poderá querer
vender, com medo que ainda desça mais.
Estas
descidas e subidas podem ser induzidas por notícias ou novidades, de
domínio publico ou confidenciais, cujo conhecimento atempado e
privilegiado, geram movimentos especulativos que normalmente se
constituem em lucros especulativos, que de forma indirecta vão
implicar subida de cotações, e por consequência aumentos de custo
a suportar a montante no mercado consumidor.
No
mercado petrolífero, dado que os principais produtores têm a
capacidade especulativa e impositiva de preços, faz com que seja
normalmente o consumidor a suportar o custo hediondo da especulação.
Só assim se compreende, que as cotações petrolíferas se tenham
mantido a níveis tão altos durante tanto tempo, até recentemente.
Só
um conjunto de circunstâncias políticas, produtivas e económicas,
permitiu que esta especulação predatória dos países e nações
sofresse uma quebra de valor. Mas não, dos lucros especulativos,
pois estes são possíveis de obter, em todas as circunstâncias.
por Octavio Serrano para o RiseUp Portugal