Os
“teóricos” neoliberais afirmam que o dinheiro não deve ter
fronteiras; que desse modo, ele circulará à vontade com a
possibilidade de financiar e promover desenvolvimento em qualquer
canto do Mundo.
Mais um conto de vigário, areia para os olhos do
cidadão comum! Pois na prática real, a movimentação de capitais
no Mundo, não é feita no interesse das populações, mas sim no
interesse da especulação desenfreada, ou obedecendo a interesses
políticos mal esclarecidos.
É
que quando esse “desenvolvimento” se realiza, ele caminha sempre
de algum modo colado à especulação; à pior, à que procura a
mais-valia mais alta, o juro mais atraente, o rapinar mais seguro.
Assim o investimento, não acompanha a necessidade das pessoas, das
populações, do Mundo, mas sim e sempre, o retorno financeiro
maximizado; o que provoca uma disparidade, entre as reais
necessidades de desenvolvimento, e o modo concentrado, em
determinados locais ou indústrias, onde ele é efectuado.
E deste
modo, nem a difusão tecnológica se faz de um modo mais proveitoso,
nem o Mundo na sua globalidade tem uma evolução simultânea. Os
países, os povos, os continentes evoluem a velocidades diferentes,
de tal modo que as disparidades económicas e sociais se aprofundam e
as pressões migratórias cada vez são maiores.
E
a perversidade de tudo isto, fica patente quando existem por exemplo
na mesma zona, investimentos fabulosos em infraestruturas, por
exemplo de exploração de petróleo, e ao lado vegetam na miséria e
na maior insalubridade milhões de pessoas. Fiquemos com um exemplo,
que nos faça compreender e constatar como verdade, este
“desenvolvimento” mal estruturado e distribuído, feito de acordo
com o oportunismo financeiro. A especulação acompanha o
desenvolvimento, e este só se realiza se satisfizer devidamente a
necessidade de lucro.
Vejamos
o vector relacionado com as relações comerciais globalistas entre
os produtores asiáticos e os consumidores ocidentais; além do
preço-hora próximo do limiar de sobrevivência dos
operários-produtores; do preço monopolista imposto aos
consumidores; necessita de investimentos que tornem mais rentável e
barato o transporte desses produtos via marítima.
É
nesse sentido, que nos aparecem investimentos feitos recentemente,
como a construção de navios super-contentores, a construção de um
segundo canal paralelo no canal do Suez, o alargamento do Canal do
Panamá, ou a nível doméstico e de mais reduzido investimento a
construção de um terminal porta-contentores em Sines. Serão
investimentos louváveis e admiráveis, no seu feito e amplitude. Mas
o que se constata na realidade, é que eles servem em primeiríssimo
lugar, para proporcionar lucro ao sistema; não são construídos
para servir as necessidades directas de povos e populações. E nesse
processo de investimento e de exploração comercial, será o sistema
global financeiro em conjunção com as elites locais que irá
aproveitar.
Comecemos
pelo princípio. A Coreia do Sul, é sede de grandes conglomerados
económicos; um deles é a Hyundai; dedica-se á produção de, entre
muitos produtos, também de novos navios. Esta empresa, por funcionar
com características de oligopólio, tem capacidade concorrencial
acrescida, e se necessário utiliza do dumping para se impôr, e
afastar concorrência. Cotada nas bolsas de valores, é uma empresa
cuja capitalização bolsista faz parte dos investimentos
financeiros, da banca de investimento mundial. É pois natural que
tenha acesso a crédito bancário favorável por parte do sistema
financeiro. É assim que se constroem os grandes estaleiros, que
permitem construir grandes super-contentores. Cujo financiamento é
facilitado por serem construídos nos estaleiros, que no fundo são
propriedade do sistema. Logo aqui nesta fase o sistema financeiro
ganha no financiamento da construção dos estaleiros, na construção
dos super-navios e com a especulação bolsista das empresas
envolvidas.
Continuemos.
Com a construção destes super-navios, onde passam a localizar-se os
maiores escolhos à navegação? Precisamente nos canais onde os
navios são forçados a passar para evitar longas travessias
transatlânticas em torno de continentes. Canal do Suez e Canal do
Panamá. Logo este problema tem de se resolver, e os interesses vão
pressionar nesse sentido. Não se interessam por construir canais,
mas estão interessados em emprestar dinheiro, para que alguém o
faça. Precisamente aos Estados do Egipto e ao Panamá.
O
que quer dizer, que quem se responsabiliza pelo pagamento dos
empréstimos e respectivos juros serão os povos egípcios e
panamenses. As companhias de navegação, proprietárias dos navios e
controladas pelos interesses financeiros, só têm de utilizar os
canais aos preços necessários e suficientes para garantir a sua
manutenção. Entretanto neste processo, os interesses financeiros
continuam a lucrar, agora não só com a cobrança de juros aos povos
que construíram os canais, como também com a rentabilidade
acrescida auferida pelas companhias proprietárias dos navios, como
indirectamente com os lucros acrescidos das margens poupadas nos
preços dos transportes.
Se
alguém me afirmar que não são investimentos importantes. Terei de
desmentir, efectivamente são-no. Agora convenha-se, que só são
executados pela simples razão de que os grandes interesses
financeiros globalistas têm interesse fundamental neles. E ganham
muito dinheiro com eles. Se não ganhassem, nunca os financiariam. E
as elites dos países envolvidos também lucrarão substancialmente.
Existem
por esse mundo, muitos investimentos, que se executados contribuiriam
decisivamente para o progresso e desenvolvimento dos povos e não são
realizados. Porquê? Pela simples razão de que não há interesse
financeiro associado.
por Octavio Serrano para o RiseUp Portugal