Numa
altura, em que o leitor irá mergulhar, num conjunto de considerações
relacionadas directamente, com o nível e qualidade da democracia,
conectadas com os sistemas eleitorais e com a forma como o vulgar
cidadão delega representação e legitimidade aos eleitos, deverá
perguntar-se a si próprio, se o vai fazer com uma mentalidade
partidocrática ou pelo contrário de cidadania participativa.
E
acredite-se, tal é decisivo não só na percepção inicial das
questões, como também na formulação do contraditório ou
concordância pessoal, face ao expresso.
Sinteticamente,
a grande diferença reside no facto, de a mentalidade partidocrática,
analisar estas questões em termos do interesse dos partidos,
enquanto a mentalidade de cidadania participativa, as analisa em
termos do interesse e participação das populações.
O
raciocínio analítico dos primeiros, subordinará egoisticamente as
questões, às necessidades dos partidos. Será o modo como se recebe
e distribui o maná dos votos recebidos; se o sistema é propicio ou
não à governabilidade; se tem a devida aparência democrática; se
garante o controlo seguro sobre o poder; se viabiliza a permanência
das élites politicas ao longo do tempo; se garante um pequeno espaço
para os mais pequeninos; se contribui e de que modo para o
financiamento partidário; se limita ou inibe completamente o
controlo do exercício do poder politico por parte das populações.
A
preocupação dos segundos, subordinará as questões ao modo como o
poder político deve emanar da participação das populações, e ao
modo como estas terão a capacidade de o controlar. Será sobre o
modo ideal de delegação e controlo do poder; sobre a forma mais
ampla e participativa de permitir que pessoas, grupos, movimentos e
partidos se disponibilizem para servir a comunidade; sobre as formas
de promover continuamente a meritocracia; sobre as formas de
relacionamento e pressão sobre os eleitos, de modo que estes estejam
ao serviço da comunidade; sobre as formas de desenvolver
interactividade constante entre eleitos e eleitores; será sobre as
formas de soberania, que poderão estar nas mãos das populações
para elas os exerçam a seu contento.
Não
posso deixar de salientar, que me choca sobremaneira, o facto de
grupos, movimentos e partidos, que se propõem programaticamente ou
estatutariamente, defender soluções reformadoras para o país, que
proporcionem participação directa do cidadão na vida publica,
optarem em contradição total consigo próprios, por defenderem
soluções relacionadas com sistemas eleitorais, de feição
partidocrática, esperando talvez juntarem-se ao nicho minoritário
do sistema.
Logo,
quem queira deveras reformar o sistema, não pode nem deve,
racionalizar as suas opções, em termos de interesse próprio da
organização a que pertence, mas tão-somente em termos ideológicos
relacionados com a cidadania participativa.
Deverá
pois defender por exemplo:
- Listas
abertas, em vez de listas fechadas impostas pelos partidos.
- O
voto nominativo, em vez do voto em sigla.
- Círculos
uninominais ou plurinominais, em vez de círculos distritais.
- Sistema
de voto directo, em vez de sistema de voto proporcional, como o
Método de Hondt.
- Aproximação
aos eleitores, em vez de afastamento dos eleitores.
- Conhecimento
intima dos candidatos, em vez de desconhecimento dos candidatos.
- Abertura
total à proposição de candidaturas, em vez de exclusividade
partidária.
- Eleitos
subordinados à vontade das populações, em vez de eleitos
subordinados à vontade das chefias partidárias.
- Possibilidade
de impugnação de mandatos, em vez de impunidade parlamentar.
- Eleitos
ao serviço das circunscrições que os elegeram, em vez de eleitos
ao serviço dos interesses económicos e políticos.
Não
basta parecê-lo, tem que se sê-lo.
por Octávio Serrano para o RiseUp Portugal