O Wikileaks lança o texto negociado final para o capítulo do TPP (Trans-Pacific Partnership) sobre os Direitos da Propriedade Intelectual TPP.
O TPP abrange 12 nações representando mais de 40% do PIB global.
Mesmo depois de haver um acordo final, o texto continua a ser ocultado ao público, notavelmente até depois das eleições Canadianas no dia 19 de Outubro.
O capítulo sobre a Propriedade Intelectual é talvez o mais controverso devido aos seus efeitos amplos quanto à Internet, medicamentos, whistleblowers, liberdades cívicas e patentes biológicas. “Se o TPP for aprovado, as pessoas cujos países se encontram dentro da orla do Pacífico, terão de viver com as regras estipuladas neste documento,” disse Peter Maybarduk, director do Public Citizen's Global Access to Medicines Program. “As novas regras do direito ao monopólio para as grandes empresas farmacêuticas, irão comprometer o acesso a medicamentos no países abrangidos pelo TPP. O TPP custará vidas.”
A seguinte introdução traduzida do Public Citizen
A publicação pelo
WikiLeaks do texto definitivo sobre a Propriedade Intelectual do acordo
Trans-Pacífico (TPP), verifica que o pacto prejudicaria a saúde pública
através do bloqueio de acesso dos doentes aos medicamentos que salvam
vidas, disse o Public Citizen. A fuga mais recente de documentos
secretos do tratado, revela como o TPP trará de volta as reformas
negociadas entre os líderes democratas do Congresso e a administração de
George W. Bush no 'Acordo de 10 de Maio' de 2007. Revela também a
controversa cláusula da "sentença de morte" sobre produtos biológicos,
ou medicamentos biotecnológicos, que agitaram as negociações em Maui e
Atlanta.
“Se o TPP for aprovado, as pessoas cujos países se encontram dentro
da Orla do Pacífico, terão de viver com as regras estipuladas neste
documento,” disse Peter Maybarduk, director do Public Citizen's Global
Access to Medicines Program (Programa de Acesso Global do Público a
Medicamentos). “As novas regras do direito ao monopólio para as grandes
empresas farmacêuticas, irão comprometer o acesso a medicamentos nos
países abrangidos pelo TPP. O TPP custará vidas.”
A fuga
vem na manhã após uma reunião na Casa Branca, com executivos
farmacêuticos que estão insatisfeitos de que o negócio não lhes fornece
uma proporção mais ampla de direitos ao monopólio.
A
indústria farmacêutica monopolista ganhou muito com o TPP, à custa da
saúde do povo,” disse Burcu Kilic, director das políticas do Public
Citizen's Global Access to Medicines Program. "Eles deviam parar com as
lágrimas de crocodilo".
O WikiLeaks publicou o capítulo completo sobre a Propriedade
Intelectual no TPP, datado de segunda-feira, 5 de Outubro, 2015 - a data
em que as 12 nações da Orla do Pacífico anunciaram o acordo
final do TPP. O texto não contém grupos de países em negociações, o que
indica que as regras não estão mais sujeitas a debate, que é a versão
final que será sujeita apenas a uma limpeza legal.
"Estas
regras finais do TPP iriam alongar, fortalecer e ampliar as patentes
especiais e protecções de dados que as empresas farmacêuticas usam para
atrasar a concorrência dos genéricos e manter os medicamentos a preços
elevados," disse Maybarduk.
O texto mostra que as regras
do TPP nem sequer estão em conformidade com a era Bush e as normas de
acesso a medicamentos do 10 de Maio que muitos congressistas democratas
tinham insistido tinham que ser melhoradas. Em violação da norma de 10
de Maio, o TPP impõe extensões de prazo de patentes a prazo e
exclusividades de comercialização mais longas, como é
demonstrado na análise do Public Citizen aqui.
Ao contrário das
normas do Acordo de 10 de Maio, o TPP exigiria que países em
desenvolvimento fizessem uma transição rápida para as mesmas regras que
se aplicam a países desenvolvidos, que proporcionam direitos de
monopólio extremo à indústria farmacêutica e limitam o acesso a
medicamentos a preços acessíveis.
"Desde muito cedo nas
negociações do TPP, e para a ira dos defensores da saúde, tornou-se
evidente que o Office of the U.S. Trade Representative - USTR
(Representante do Gabinete do Comércio dos EUA) estava a abandonar o
modelo do Acordo de 10 de Maio,” disse Maybarduk. “Hoje, pela primeira
vez e com a publicação pelo WikiLeaks da versão final do capítulo sobre a
Propriedade Intelectual no TPP, o público pode ver o que foi acordado
entre os negociadores e, substancialmente, o quanto as normas carecem
relativamente ao Acordo de 10 de Maio e ao alargarem as obrigações dos
países em desenvolvimento quanto à propriedade intelectual das
indústrias farmacêuticas.”
A propriedade intelectual
farmacêutica e o acesso a medicamentos têm sido questões especialmente
controversas nas negociações do TPP, e contribuíram para o ano de atraso
no cronograma do governo de Obama para a conclusão do acordo TPP.
Enquanto vários novos direitos de monopólio para as empresas
farmacêuticas foram acordados pelas nações, confrontos de nações
participantes em relação a uma regra de exclusividade especial para
produtos biológicos – derivados médicos de organismos vivos, incluindo
muitos tratamentos novos e futuros contra o cancro – contribuíram para o
colapso do ministerial de Agosto no Havai e o o dobro das horas extras
que quase falhou, em Atlanta.
A exclusividade de biológicos é separada e independente da protecção da patente, embora as protecções possam sobrepor-se. O USTR inicialmente apoiou
um período de doze - e, em seguida, de oito – anos como período mínimo
de monopólio, enquanto um bloco maioritário de países envolvidos nas
negociações não consideraria uma exclusividade de mais de cinco anos.
(Cinco países não fornecem nenhuma regra especial de exclusividade para
os biológicos nas suas leis.) Uma análise do Public Citizen sobre as
provisões para biológicos está disponível aqui.
O documento final impõe um período mínimo obrigatório de cinco anos.
Também submete o assunto para futuras discussões sobre uma "Comissão do
TPP" e de esforços "para entregar um período efectivo comparável.”
período. "Isto reflecte um esforço da parte do USTR para impor
monopólios de oito anos nos países que recusam.
“Esta
linguagem propositadamente ambígua, serve para fornecer o USTR de um
meio para assediar países no futuro, e para continuar a pressionar por
monopólios mais longos e a aumentar os lucros da indústria à custa da
saúde das pessoas,” disse Kilic.
O USTR tem indicado que a sua
solução para acesso a medicamentos iria incluir períodos de transição
para países em desenvolvimento. No entanto, os documentos divulgados
pelo WikiLeaks mostram que os períodos de transição seriam apenas de
entre três a dez anos e aplicar-se-iam somente a algumas das regras em
discussão.
Uma análise do Public Citizen sobre os períodos de transição que
constam no documento no texto vazado está disponível aqui.
Forçando regras expansivas de monopólio farmacêutico em
países que não podem pagar preços elevados pelos medicamentos nem sempre
tem sido a política comercial dos Estados Unidos, e no passado os
políticos norte-americanos reconheceram que as necessidades dos países
em desenvolvimento não deveriam estar sempre subordinadas aos lucros da
indústria farmacêutica americana,” disse Maybarduk . "Alguns
funcionários públicos raros nos países TPP lutaram contra e apoiaram a
saúde nesta negociação. Os seus esforços salvaram vidas,” disse
Maybarduk. "No entanto, no final, o TPP ainda vai negociar com a nossa
saúde.”
Resumo em Português do documento
Nota importante da tradutora: Antes de mais é importante salientar
que ao ler a palavra 'biológica' ou quaisquer similares, que não se
estão a referir à comida ou produtos livres de transgénicos (ou sem
herbicidas ou pesticidas), mas sim a medicamentos que incluem proteínas
terapêuticas, vacinas ADN, anticorpos mono-clonais e proteínas de fusão
que são provavelmente produtos transgénicos.
“Ambiguidade leva à falsidade: Exclusividade Biológica no Trans-Pacific Partnership (TPP)” (1)
Uma
fuga de documentos (2) mostra que o TPP imporia novos requisitos de
monopólio, limitando o acesso a novos medicamentos contra o cancro assim
como a tratamentos biotécnicos.
O que são os medicamentos Biológicos?
Medicamentos
biológicos são moléculas complexas tais como proteínas que são isoladas
a partir de plantas, animais e micro-organismos ou criados através do
uso da biotecnologia. Podem incluir vacinas, medicamentos contra o
cancro e terapias como a insulina. Eles constituem uma grande parte dos
medicamentos usados, continuam em crescimento e poderão custar dezenas
ou mesmo centenas de milhares de dólares por paciente por ano, e são
frequentemente necessários por toda a vida(a). Isto é incomportável
mesmo para o governo dos EUA. A administração do Obama tem proposto
repetidamente no seu orçamento, a redução dos actuais 12 anos de
exclusividade dos medicamentos biológicos para 7 anos(b).
Relação
com as patentes: Biológicos podem não ser patenteáveis em todos os
casos, pois são produtos naturais, tais como a insulina ou como os
componentes do sangue humano(c). Este documento exige que os países
abrangidos pelo TPP parem de disponibilizar versões genéricas de
medicamentos biológicos ("biosimilares") aos pacientes, mesmo quando não
há nenhuma patente ou para além da duração de uma patente.
Prazo de exclusividade: Mínimo obrigatório de 5 anos (e mecanismos para aumentar a pressão)
O texto tem duas opções para os países no TPP que têm que optar por uma:
a) dar 8 anos de exclusividade de mercado(3) a contar da data em que o produto biológico é aprovado no país em causa(d), ou
b) dar 5 anos de exclusividade de mercado(4) contando a partir da data
em que o produto biológico é aprovado no país em causa(5) e outras
medidas para entregar um resultado comparável no mercado(e).
Vários
governos dos países abrangidos pelo TPP declararam que não serão
obrigados a modificar os sistemas de 5 anos de exclusividade dos
biológicos já existentes(f). Enquanto estes países afirmam que não irão
além dos seus níveis actuais de protecção e da exclusividade dos
biológicos, terá ainda que ser confirmado se poderão manter essa posição
no processo de certificação exigido pela lei de 'fast-track' nos EUA,
onde no passado os Estados Unidos pediram a outros países uma protecção
de Propriedade Intelectual (PI) (inclusive sobre os medicamentos), maior
do que o texto da USFTA (United States Free Trade Agreement) requer(g),
e exigia que os países reduzissem a eficácia das suas excepções para
PI(h)
Aplicabilidade: Definição de Biológicos
Esta exclusividade
deve ser prevista para medicamentos que tratam ou curam doenças ou
condições humanas, ou as impedem (por exemplo, vacinas) se são proteínas
que são feitas utilizando um processo de biotecnologia(i). A maioria
dos produtos biológicos são proteínas(j), e assim sendo a definição de
biológicos terá de incluir proteínas (a maioria das vacinas e produtos
sanguíneos) exclui poucos produtos. O “processo de biotecnologia "pode
ser definido em legislação nacional(k), o que permitirá que ela seja
actualizada conforme a ciência muda.
Avaliação da Comissão do TPP
Independentemente
da opção implementada por qualquer país TPP, haverá uma avaliação da
extensão do monopólio da exclusividade biológica e de quais os produtos
farmacêuticos que irão obter essa exclusividade(l). Esta avaliação pode
aumentar o número de produtos farmacêuticos que recebem exclusividade
biológica por mais tempo.
Excepções para Proteger a Saúde Pública
As
excepções para a saúde(6) para todos os países TPP são as enumerados no
QQE16.3. O Public Citizen, a Third World Network e outros observadores,
incluindo o Professor Carlos Correa(7) têm sugerido uma expansão da
linguagem para fornecer um caminho operacional claro para as excepções
de saúde na exclusividade comercial. A provisão real não fornece
orientação muito específica. No entanto, ela faz referência a todas as
cláusulas de exclusividade do TPP. Isto deve significar que partes do
acordo podem prever excepções saúde na exclusividade de mercado para
produtos biológicos. Chile tem preservado a excepção de saúde e outras
(8) na sua lei, a qual o Chile pode usar para anular a exclusividade dos
biológicos(m)
Período concorrente: O anexo do Peru incorpora o
conceito de período simultâneo do Acordo de Maio 10 e o FTA entre os
EUA e Peru. O Peru tem a opção de iniciar o relógio de exclusividade a
partir da data de aprovação da comercialização nos EUA (ou primeira
aprovação em outra parte do TPP), em vez de a partir da data de
aprovação de comercialização no Peru. Isto aplica-se, no entanto, apenas
se o Peru aprovar um produto dentro dos 6 meses após a data de um
pedido ser apresentado com as autoridades peruanas.
Em termos práticos,
isso pode encurtar o período de exclusividade no Peru se o requerente da patente
levar muito tempo para solicitar a aprovação de comercialização no Peru.
Outros países TPP que também dependem de aprovação de comercialização
noutros países, não têm essa excepção. Desta forma o
TPP mostra não estar à altura do padrão do Acordo de 10 de Maio para
outros países em desenvolvimento.
Janela de acesso: Brunei e
Malásia podem exigir que o originador solicite aprovação comercial em
Brunei/Malásia nos 18 meses depois da aprovação para comercialização em
qualquer lugar no mundo, ou caso contrário, a exclusividade biológica é
perdida nos termos do artigo QQE20.1(9, n). Isto é para incentivar as
empresas de medicamentos originais a trazerem os seus novos medicamentos
mais rapidamente para países com uma população pequena(10)
RiseUp Portugal
(1)
Sanya Smith Reid, consultora jurídica , e directora jurídica e de
política de Third World Network & Burcu Kilic, Public Citizen's
Global Access to Medicines Program.
(2) Disponível aqui https://wikileaks.org/tpp-ip3
(3) Do tipo no Artigo QQE16.
(4) Do tipo no Artigo QQE16.1
(5) Ver explicação para opção a) e Peru tem a mesma excepção aqui.
(6)
Apesar do Artigo QQA7 ter Percepções Relativas a Certas Medidas de
Saúde Pública (Understandings Regarding Certain Public Health Measures),
questões têm sido colocadas acerca da eficácia da similaridade da
terminologia usada no mesmo capítulo numa versão anterior deste
documento, ex:
http://www.unitaid.eu/images/marketdynamics/publications/TPPA-Report_Final.pdf
Além disso, os USFTAs anteriores não permitiram que a excepção
da saúde incluida no capítulo geral das excepções fosse aplicada ao
capítulo da PI, ex:
https://ustr.gov/trade-agreements/free-trade-agreements.
O resumo do
governo malaio sobre o TPP, assinala que há uma excepção de saúde para
os capítulos de bens e serviços, mas que não menciona que também se
aplica ao capítulo do PI,
http://fta.miti.gov.my/miti-fta/resources/Summary_of_The_Trans-Pacific_Partnership_ Agreement.pdf. Além do mais, http://fta.miti.gov.my/miti-fta/resources/Summary_of_The_Trans-Pacific_Partnership_Agreement.pdf
indica que as excepções de saúde usarão a terminologia das regars da
World Trade Organization (WTO) que tem sido tão difícil de usar, que na
história da WTO aquelas excepções gerais só sucederam uma vez em 44
tentativas, http://www.citizen.org/documents/general-exception.pdf
(7)
"... Esta linguagem tem pouco ou nenhum efeito prático.
De qualquer
forma, ela não limitaria as obrigações impostas pelo acordo. A referida
declaração só confirma as flexibilidades permitidas pelo Acordo TRIPS
relativamente a questões de saúde pública (como licenças obrigatórias e
as importações paralelas), mas é provável que forneça uma base jurídica
suficiente para derrogar as obrigações estabelecidas pelo TPP ", Carlos
M. Correa. Intellectual Property in the Trans-Pacific Partnership:
Increasing the Barriers for the Access to Affordable Medicines. South
Center Research Paper No. 62, September, 2015,
http://www.southcentre.int/research-paper-62-september-2015
(8) Por
exemplo, além da saúde, e não para o uso público comercial, a cessação
da exclusividade é permitida numa emergência nacional, ou noutras
circunstâncias de extrema urgência declaradas pelas autoridades
competentes e de segurança nacional. As licenças obrigatórias, práticas
anti-concorrenciais por parte da empresa cedente, a não comercialização
no Chile por mais de 12 meses depois de obter a aprovação de
comercialização no Chile etc, resultará na anulação da protecção sob
este parágrafo, http://www.wipo.int/wipolex/en/text.jsp?file_id=270135, http://www.ifpma.org/fileadmin/content/Publication/IFPMA_2011_Data_Exclusivity__En_Web.pd,
http://www.wipo.int/wipolex/en/text.jsp?file_id=338935
(9)
Presumivelmente, o erro de digitação na referência (o anexo refere-se a
18.E.20.1 Enquanto que o numeração da prestação biológicos no texto é
QQE20.1) será corrigido quando for visto pelos advogados para evitar
processos futuros.
(10) Additional Exclusivity for Biologics Drugs in
the TPP: A Need or Greed?, Relatório do Public Citizen, Julho 2015
disponível em:
:http://www.citizen.org/documents/public-citizen-report-tpp-biologics-lag-time.pdf
(a) Clicar aqui para mais exemplos
do custo dos Biológicos.
(b) Ex: https://www.whitehouse.gov/sites/default/files/omb/budget/fy2016/assets/budget.pdf.
(c) Ver este link
para exemplos de Biológicos
(d) Artigo QQE20.1a)
(e) Artigo QQE20.1b)
(f)
Ex: Australia:
http://dfat.gov.au/trade/agreements/tpp/outcomes-documents/Pages/outcomes-biologics.aspx;
Chile:
https://ustr.gov/about-us/policy-offices/press-office/speechestranscripts/2015/october/transcript-trans-pacific; Nova Zelândia:
http://tpp.mfat.govt.nz/assets/docs/TPP_ factsheet_Intellectual-Property.PDF; Singapura:
https://www.politicopro.com/trade/story/2015/10/ pro-trade-tppbiologics-behsudi-059493
(g) http://tppnocertification.org/wp-content/uploads/2014/08/Certification-memorandum.pdf
(h) Ex: http://tppnocertification.org/australias-experience/
(i) Artigo QQE20.2
(j)
http://www.researchgate.net/profile/Jinyou_Zhang2/publication/225033892_Mammalian_Cell_ Culture_for_Biopharmaceutical_Production/links/0fcfd4fbcfaf09b585000000.pdf
(k) Nota do rodapé no. 65
(l) Artigo QQE20.3
(m) Anexo no PI Capítulo 4 - Chile
(n) Anexo do PI Capítulo 5 - Brunei e Malasia