25/11/2016

E agora já vamos prestar atenção ?

O Presidente da CMVM faz relatório preocupante. Ainda o piorámos com informação adicional, ao simplificá-lo e a acrescentar perguntas.
"É mais fácil enganar as pessoas, que convencê-las que foram enganadas" - Mark Twain
 
Trouxeram à nossa atenção um relatório intitulado - "A Crise Financeira: Aprendemos as Lições?" - com 46 páginas realizado pelo Carlos Tavares, actual presidente da Comissão do Mercados de Valores Mobiliários. Nem este nem o Banco de Portugal são farol ou sinónimo de instituições a ter em conta para estarmos a salvo de trafulhices e esquemas bancário-financeiros, contudo são fontes de informação com interesse nacional. Dito isto, vamos falar do mais importante deste artigo, simplificando ainda mais, adicionando informação e colocando as perguntas que poucos fazem. Para os impacientes, a resposta é - Não, não aprendemos as lições, e só não aprendemos nada como está tudo pior, e a conclusão até nem é nossa. E agora já vamos prestar atenção?


Da "crise de 2007" resultaram uma série de recomendações para "evitar" novas crises
 
i) Que os bancos deveriam ser mais pequenos e mais simples;
ii) Que o excesso de crédito/dívida que conduzira ao desencadear da crise imporia um processo de desalavancagem significativa;
iii) Que os mercados deviam ser mais regulados e mais transparentes;
iv) Que os produtos financeiros deveriam ser mais simples e de características bem conhecidas dos investidores;
v) Que seriam necessárias melhores avaliação e gestão dos riscos


Passados 8 anos estamos assim;


i) Os bancos serão mesmo mais pequenos e mais simples?...

 
Apesar da quebra de valor, a euforia das fusões e aquisições de instituições financeiras teve máximos em 2014 e 2015 e que parece continuar em 2016. De recordar que em apenas 20 anos, os 37 maiores bancos americanos deram origem a apenas 4 super bancos. Queriam "evitar" a todo o custo ter mais bancos "too big to fail" e falharam, mas isto levanta outra questão. Se hoje um banco é demasiado grande para falir e é resgatado, quando precisar de um novo resgate amanhã o que será? Ter instituições com responsabilidades sociais desta dimensão e a laborar com esta moral operacional é passar cheques em branco assinados pelos contribuintes de todo o planeta.


O Goldman Sachs é 23% mais pequeno que em 2007, Morgan Stanley é 21% mais pequeno e o Citi uns 16% mais reduzido. Acontece que hoje em dia é difícil ou mesmo impossível saber o tamanho real de um banco, e tudo graças aos mercados de derivados. A maior parte deste mercado não é regulado, dito de outra forma rege-se pela auto-regulação e permite quase tudo, esconder prejuízos e empolar resultados operacionais, desvio de verbas/lucros para offshores, bem a imaginação é o limite. O ambiente de taxas de juros negativas tem animado bastante este mercado, em que o OTC, cuja sigla se lê "Over The Counter"- Por Cima do Contador - é o de "referência" para os entendidos. Aqui fazem-se operações directas entre duas partes ou mais, sem documentos públicos e ou qualquer supervisão. Pergunta: Os bancos parecem mais pequenos e mais simples? BES e Deustche Bank acham que sim, um porque desapareceu e o outro porque ninguém à face da terra consegue entender as contas que apresenta.


ii) O endividamento global aumentou
 
Em 2007 concluiu-se que existia demasiada dívida, e a questão feita pelo Governador do Banco Central da Islândia foi que parte da dívida criada a partir do nada (Pública + Privada) seria possível efectivamente pagar. Assim, o processo de desalavancagem (amortizar dívida) que se apontava como indispensável há oito anos, não só não teve lugar em geral como se verificou um aumento muito significativo em todos os agentes. Traduzindo, o Endividamento Global aumentou exponencialmente.


Em 2007 era de 142 triliões de dólares, em 2014 era de 199 triliões e em 2015 já ia nos 230 triliões, ou seja, em função do PIB em 2007 existia um endividamento global de 269%, em 2014 passou para 286% e em 2015 ficou perto dos 300%. "Note-se ainda que os valores indicados não incluem a dívida implícita correspondente às responsabilidades constituídas e não cobertas pelos sistemas de segurança social pública. Algumas estimativas apontam para que a inclusão desta dívida implícita elevaria a dívida global para cerca de 400% do PIB". Da Europa a 28, 16 países apresentam dívidas superiores a 200% do PIB, Portugal é o quarto com a dívida mais elevada.


A redução do valor da dívida sobre PIB, seja um País ou o Mundo rege-se pela famosa equação da dinâmica da dívida, nós preferimos aritmética simples. Se a dívida for 100% do PIB e tiver taxas de juros reais de 1%, significa que tem crescer anualmente 1% para não aumentar, mas sem amortização. Se os juros forem de 2% tem de crescer 2%, e por aí adiante.


Se a dívida for de 286% do PIB e a quisermos reduzir para 200% em 10 anos com taxas de juros reais de 2%, o PIB do país ou do mundo teria que crescer mais de 5,7% ao ano durante 10 anos. Visto de outra óptica, pressupondo taxas de juro, inflação e de crescimento “normais”* concluímos que a mesma redução em 10 anos do rácio da dívida exigiria que todos os anos a economia global gerasse um excedente de quase 25% do PIB totalmente aplicado na amortização da dívida. Se a taxa de juro subisse 1%, o excedente requerido elevar-se-ia para cerca de 39% do PIB.


Estes crescimentos são totalmente irrealistas, impensáveis e nunca foram sequer alcançados, o melhor que conseguimos nos últimos 53 anos foi uma média de crescimento da Economia Global de 3.8%, os entendidos consideram que abaixo de 3% é recessão. Apenas na década de 60-70 conseguimos uns 5.5% e graças à revolução industrial das décadas de 50-60-70


Tudo isto é manipulável para obtenção de lucros, desde taxas de juros, passando pela inflação e acabando nas taxas de crescimento, mentalize-se disto. E daí as chamadas taxas de juros reais, porque swaps podem esconder taxas de juros que somam às reais mas que poucos sabem.



Sobre crises e citando o presidente da CMVM;

"É claro que poderá dizer-se que essa riqueza não se perde, simplesmente muda de mãos. Mas não é clara a forma como os agentes endividados (famílias, empresas, Estados) poderão gerar os meios necessários para reembolsar os agentes credores."


A forma é secalhar bastante clara, basta manter as populações presas ao pagamento de dívidas impossíveis de pagar, que não sabem que existem e num sistema em que pouco ou nada percebem. Não somos contra este sistema simplesmente porque não gostámos dele, somos contra porque é de facto uma fraude por mais impensável que possa parecer.


Já sabemos que o Mundo no global tem uma dívida superior a 300 triliões, só ainda não "sabemos" a quem.


*Taxa de juro real de 5%; inflação: 2%; crescimento real: 2,5%

Média das Taxas de Juro da Dívida Pública Portuguesa: +-3.5%


Crescimento Economia Portuguesa (16 anos)
2000 3,79
2001 1,94
2002 0,77
2003 -0,93
2004 1,81
2005 0,77
2006 1,55
2007 2,49
2008 0,20
2009 -2,98
2010 1,90
2011 -1,83
2012 -4,03
2013 -1,13
2014 0,89
2015 Pre1,60


Fontes/Entidades: INE, INE | BP, PORDATA
Última actualização: 2016-10-20


Com isto, e citando o outro engenheiro, é só fazer as contas.


iii) Parte substancial das transacções não passa pelos mercados
regulamentados
 
Este é o melhor dos capítulos deste sistema actual. Quando este tema é abordado, ninguém acredita muito bem a rambóia que são os mercados. Quando falámos sobre as "dark pools", comparámos isso com festas privadas. Pode acontecer tudo, desde que ninguém fale não se sabe de nada.


"De tal modo que a negociação transparente passou a representar apenas cerca de metade do total. Mas se para as acções foi assim, no que diz respeito a obrigações e derivados a situação era bem mais grave, já que o mercado OTC era o dominante. Em 2008, o objectivo estabelecido foi o de levar a que as transacções se processassem predominantemente em mercados regulamentados e que a negociação fosse transparente.


Oito anos depois, verificamos, no entanto, que cerca de metade da negociação de acções continua a corresponder a transacções OTC ou a ordens não transparentes em mercados regulamentados. Podemos também constatar que a transacção de obrigações continua a não ter requisitos de transparência, que só serão concretizados – de forma ainda limitada – na DMIF II, cuja entrada em vigor está prevista para 2018, dez anos depois da formulação dos objectivos referidos."


Isto tudo para dizer que os mercados já têm novas formas de negociação para as poucas limitações que vêm em 2018 e que os "reguladores" vão depois precisar de mais 10 anos para as acompanharem e assim sucessivamente.


Metódos de negociação na Bolsa Portuguesa, PSI 20, que só tem 17 empresas.

1) Regulamentado ; 2) Dark Polls ; 3) Internalizadores Sistemáticos ; 4) Off- Book.


Tradução para português corrente?


1) Esquemas mais ou menos Regulados e nem todos ; 2) Esquemas em Festas Privadas ;
3) Esquemas de Especulação ; 4) Outros Esquemas


Tradução "real"

1) São mercados regulamentados os que funcionam regularmente e obedecem a requisitos exigentes quanto à prestação de informação, à admissão dos membros do mercado e dos valores mobiliários à negociação e ao respectivo funcionamento, sendo autorizados, a pedido do requerente, por portaria do Ministério das Finanças, ouvida a CMVM.


Os mercados regulados (e também os não regulados) são geridos por entidades registadas na CMVM e que são obrigados a demonstrar que se encontram equipados com meios técnicos e humanos adequados ao exercício da actividade.


2) Dark Pools são plataformas financeiras nas quais os títulos são contratados de forma anónima.


3) São Internalizadores Sistemáticos (SI) os intermediários financeiros que executam ordens dos investidores contra a sua própria carteira de forma organizada e sistemática, em detrimento de o fazerem num mercado regulamentado ou através de um sistema de negociação multilateral.


iv) A colocação de produtos financeiros complexos mantém-se pujante.


Sobre isto o presidente esclarece a "cowboyada", nós nada acrescentamos.


"A criação e distribuição de produtos financeiros complexos e frequentemente bastante opacos foi, reconhecidamente, uma das causas de amplificação e propagação da crise financeira iniciada em 2007/2008. Por isso, não surpreendeu a recomendação de que os produtos financeiros deveriam ser mais simples, transparentes e mais fáceis de entender pelos investidores. Ora, o que verificamos oito anos depois é que, apesar do montante “vivo” de produtos complexos ter vindo a diminuir paulatinamente, o número de produtos distribuídos tem aumentado consistentemente. Ao mesmo tempo, observa-se uma tendência recente para o aumento da complexidade e dos riscos de perda de capital, fruto da procura de rentabilidades potenciais mais elevadas no contexto de taxas de juro prolongadamente muito baixas.


Note-se que a produção e distribuição deste tipo de produtos têm correspondido à – e provavelmente sido motivadas pela – transferência de riscos dos balanços dos bancos para outros agentes, incluindo os clientes de retalho. Além disso, para além dos “produtos estruturados” mais tradicionais (reflectidos nos gráficos infra), têm aparecido novos e mais sofisticados produtos, como os ETF, os ETF sintéticos e as opções binárias, por exemplo, que apresentam dificuldades de compreensão e avultados riscos de capital e de liquidez. Em particular, os ETF têm vindo a crescer em número e em valor quer na Europa, quer nos Estados Unidos"


Sobre as taxas de juro negativas:
 
"Os efeitos colaterais das taxas de juro prolongadamente muito baixas têm vindo a manifestar-se e a acentuar-se em comportamentos de “procura por ganhos”, implicando acumulação de riscos de crédito e de taxa de juro e induzindo ainda maior complexidade dos produtos financeiros, como já foi referido. Ao mesmo tempo, têm criado condições de exploração difíceis para o sistema bancário, com riscos para a estabilidade financeira."


Debruça-se depois à procura de explicações teóricas para as taxas de juros negativas, quando já escreveu a explicação no ponto ii) Endividamento Global aumentou... O mundo deixou de conseguir absorver crédito àquela velocidade, então o sistema teve que empurrá-lo à força para sobreviver. Como? Quantitative Easing, Expansão Monetária ou Impressão de Dinheiro em Quantidades Totalmente Absurdas. Está tudo assustado por dois simples motivos, esta expansão monetária e as taxas de juros negativas é que vão mantendo isto nos arames. Nem uma nem outra podem continuar indefinidamente, e quando isto acabar... Taxas de juros a subir e menos liquidez a circular para pagá-las, será a "crise" seguinte?


Deixámos aqui o relatório para leitura, agora pode acreditar que eles estão a tratar do assunto como é dito e sempre disseram, ou finalmente entender que tudo isto é um mega esquema, legitimado graças ao desconhecimento que existe do próprio sistema por quem o constitui, todos nós.


"Convém que o povo não perceba o sistema bancário e monetário, pois se percebesse, acredito que haveria uma revolução antes de amanhã de manhã." Henry Ford - 1922


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