Em Novembro de 2013, queixava-me
do seguinte: durante meses a fio tivemos de suportar os euro-iludidos
com a narrativa das eleições alemãs; aguentem, depois é que pode começar
a mudança na Europa, diziam.
Agora, em final de 2016, falta menos de um ano para as novas eleições
legislativas alemãs e já recomeçou o discurso aparentemente
euro-iludido: aguardemos por 2017, diz-se, então as coisas podem começar
a mudar depois das eleições alemãs; por exemplo, no que à renegociação
da dívida diz respeito.
Nada mudará para melhor pela Alemanha, claro, dado o consenso
ordoliberal entranhado numa potência credora: a renegociação da dívida é
sempre para ir sendo feita nos tempos e nos termos dos credores, para
ir sendo usada como instrumento de condicionalidade política, garantindo
a neoliberalização das economias políticas nacionais periféricas,
sobretudo no campo onde quase tudo se decide, o das relações laborais,
ou seja, garantindo custos salariais, directos e indirectos,
relativamente baixos para os capitais que circulam por aí a partir do
centro.
A Grécia, em greve geral esta semana contra este regime externo e os
seus executantes internos, aí está a ilustrar pela enésima a economia
política europeia da dívida. O eco de Bruxelas cá no burgo, também
conhecido pelo nome de Conselho das Finanças Públicas, também confirma à
sua ideológica maneira isto.
E como isto está tudo ligado, não causará admiração que um governo que
não quer tomar qualquer iniciativa na área da dívida, com receio das
implicações de tal acto de desobediência em termos da pertença a uma
zona monetária disfuncional, seja também um governo que, pelos vistos,
não quer mexer nas regras laborais regressivas herdadas da troika e do
seu espírito nos anos anteriores à agressão externa, em particular na
área onde as vitórias de classe foram mais fortes: a destruição da contratação colectiva.
Se isto se confirmar, a política de um governo apoiado pelas esquerdas
será apenas um momento temporário de travagem do tal comboio rumo ao
abismo.
Na melhor das hipóteses, tal dever-se-á ao facto de não se querer
afrontar o eixo Bruxelas-Frankfurt numa área que este segue com
particular atenção. Não preciso de dizer mais nada sobre a natureza da
integração europeia e das suas instituições de suporte. Já só não vê,
quem não quer mesmo ver. Sejamos francos: o aprofundamento da crise de
legitimação destas instituições controladas pela grande potência da
zona, fruto do agudizar das contradicções que lhe são inerentes, é uma
condição necessária, se bem que obviamente não suficiente, para mudar as
regras viciadas deste jogo e para dar mais margem de manobra aos
governos democráticos nacionais das periferias.
Por Ladrões de Biclicletas