O capitalismo globalista não gosta de fronteiras; nomeadamente quando
servem de travão à venda livre dos seus produtos.
Mas não é de agora!
O nosso presente sistema, não é o primeiro da história, com essas
características. No Seculo XIX os ingleses instauraram um sistema desse
género, quase a nível global.
Nessa altura o Império Chinês poderia ser
ainda feudal, e não possuir os meios tecnológicos que se tinham
entretanto desenvolvido no Ocidente, mas conseguiam sustentar-se a si
próprios sem necessitar de grandes importações. Para que o comércio do
Império Britânico fosse rentável, era necessário um produto que os
chineses não tivessem, mas que fossem doidos por ele. E esse produto era
o ópio. Os ingleses haviam há algum tempo começado a fornecer ópio à
China, e os resultados ao nível do seu tecido social e de balança de
pagamentos tinha sido catastrófico para o império do Meio.
Quando os
ingleses quiseram impor um Tratado, que permitia a venda livre do seu ópio na China, as forças nacionalistas encabeçadas pelo seu imperador
opuseram-se, mas foram derrotadas nas duas guerras que se seguiram. A
capitulação definitiva deu-se com a ocupação de Pequim por forças
expedicionárias de vários países ocidentais, que ocuparam Pequim e a
dividiram entre si em zonas de influência.
O imperador chinês passou a
ser uma mera figura de opereta. Estes acontecimentos feriram
profundamente o orgulho do povo chinês, e seriam o fermento poderoso de
um nacionalismo que no seculo seguinte expulsaria todos os interesses
estrangeiros e culminaria com a fundação da Republica Popular.
Se
lermos e interpretarmos com atenção experiências mais antigas,
comprovamos um facto muito simples. A livre e desonerada circulação de
mercadorias, ontem como hoje, só é realmente lucrativa para a parte que
controla o processo entre a origem e o destino; pois possui a capacidade
quase monopolista de impôr os preços que garantem a maximização dos
seus lucros. Se um Estado impõe taxas alfandegárias ou quotas fixas de
importação reduz substancialmente os lucros das multinacionais, não em
relação à margem praticada, mas em relação ao volume do negócio que
potencialmente poderia existir. E os Estados têm razões ponderosas
para se oporem ao globalismo económico e financeiro, sem regras e sem
controlo. Algumas delas…
A isenção ou redução de direitos
alfandegários priva o Estado de um importante instrumento de regulação
económica, aplicável em várias situações.
Primeira - O Estado pode
decidir que os preços dos produtos importados, têm práticas de dumping
comercial associado; ou que existe um dumping social no Estado
exportador; ou que existe uma tentativa do Mercado para destruir alguma
indústria doméstica; ou que se necessita de proporcionar algum tempo à
indústria nacional, para se adaptar tecnologicamente a introduções
radicais em processos de fabrico. Nestas situações imporá taxas
alfandegárias de modo a nivelar os preços dos produtos importados com os
produzidos internamente.
A temporalidade necessária deste género de
medidas tem a ver com cada circunstância em particular. Mas terá sempre
de existir o cuidado de evitar que a “protecção” à produção interna,
incentive falta de investimento e desenvolvimento tecnológico.
Segunda - A existência de uma produção nacional com tão grande impacto
social e económico interno, que a importação a preços mais acessíveis
provocasse internamente um descalabro social e económico, motivado pela
falência do sector em causa. Nestas circunstâncias, seria função de um
governo preparar a diversificação produtiva substituta ou acréscimos de
produtividade no sector em causa. O tempo para levar a efeito essa
reconversão, teria em parte de ser proporcionado por uma protecção
alfandegária ao sector em causa.
Terceira - Caso fosse interesse
nacional a promoção de determinada indústria nascente, faria sentido a
sua protecção nas fases de arranque, de crescimento e amadurecimento; de
modo que a curva da experiencia pudesse ser obtida em conjunção com a
capitalização necessária à provável futura competição em mercado
internacional aberto. A melhor forma de o fazer, seria a protecção
intramuros em relação a ofensivas comerciais externas de produtos
análogos ou sucedâneos. E as taxas alfandegárias ou quotas de importação
seriam igualmente a melhor forma de garantir essa protecção.
Quarta - O controlo do endividamento excessivo, privado e público, pode
ser feito, pela oneração dos produtos importados. Tradicionalmente tal é
feito sobre os produtos que não sejam de primeira necessidade. A
imposição de quotas e taxas onera de tal forma os produtos, que o seu
consumo se torna proibitivo.
Ainda hoje, e apesar da integração de
Portugal na CE, o sector automóvel é um exemplo tipo. A aplicação do
Imposto automóvel, acrescido do Iva, limita muito a aquisição de
veículos pelos particulares, nomeadamente de cilindradas mais elevadas.
Quinta - A aplicação de taxas alfandegárias e a imposição de quotas de
importação, foi e pode ser utilizada, como medida politica de incentivo
às multinacionais, para se instalarem num país, cujo mercado seja
apetecível, a fim de que possam estar à vontade nesse mercado.
Nessa
situação serão obrigadas a localizar determinadas indústrias,
nomeadamente de montagem, criando a possibilidade de a montante se
criarem indústrias dependentes para fornecimento de acessórios,
propiciando desse modo a existência de especializações industriais e
empregabilidade das populações.
Sexta - A existência de taxas
alfandegárias, constitui-se indirectamente como um fomento de
independência e soberania. Ao proteger a produção interna, torna o país
menos dependente de factores externos que não controla; a existência de
uma indústria nacional estruturada contribui para a aproximação do pleno
emprego dos recursos humanos, para a disseminação interna de riqueza e
para a manutenção de um nível suportável de desigualdades. Tudo factores
essências a um país próspero e progressivo.
Sétima - Qualquer país
deve incentivar as suas trocas comerciais a nível global. A existência
de uma boa pauta aduaneira permite os acordos bilaterais ou
multilaterais de uma forma equilibrada e negociável caso a caso. Um país
que se demita desta premissa, está sujeito a concluir acordos
prejudiciais aos seus interesses como nação. E a ser subjugado comercial
e quiçá politicamente.
Oitava - A aplicação de taxas aduaneiras
constitui-se como uma importante e não desprezível receita. Um Estado
com receitas suficientes é factor económico primordial no
desenvolvimento infraestrutural do território e da economia. Um Estado
solvente e equilibrado é a Instituição fundamental de uma Nação, que lhe
permite ter relações internacionais livres e desoneradas, de igualdade e
de independência. Atitude fundamental num Mundo, em que a subjugação
económica e política grassa, com total desprezo pelos interesses dos
povos que atinge.
Julgo que fica demonstrado á saciedade com estas
premissas, as razões pelas quais os interesses globalistas não gostam de
fronteiras económicas.
Reduzem-lhes os lucros e os seus interesses
ficam limitados, em função dos desejos das Nações. E isso é
inadmissível ...
por Octavio Serrano