"Em 2001, a Grécia procurava maneiras de
mascarar os seus crescentes problemas financeiros. O Tratado de
Maastricht exigia que todos os membros da zona do euro mostrassem
melhorias nas contas públicas, mas a Grécia ia na direção oposta.Então o
Goldman Sachs veio em seu socorro, oferecendo um empréstimo secreto de
2,8 mil milhões de euros, disfarçado de swap cambial não contabilizado –
uma operação complicada, em que a dívida da Grécia em moeda estrangeira
foi convertida em obrigações em moeda local, utilizando uma taxa de
câmbio fictícia.
Em 2005, a Grécia já devia quase o dobro do que constara no acordo, fazendo a dívida não declarada saltar de 2,8 mil milhões para 5,1 mil milhões de euros. Em 2005, o acordo foi reestruturado e a dívida fixada em 5,1 milhões. Talvez não por acaso, Mario Draghi, hoje presidente do Banco Central Europeu e um ator importante no atual drama grego, era então o diretor da divisão internacional do Goldman."
Em 2005, a Grécia já devia quase o dobro do que constara no acordo, fazendo a dívida não declarada saltar de 2,8 mil milhões para 5,1 mil milhões de euros. Em 2005, o acordo foi reestruturado e a dívida fixada em 5,1 milhões. Talvez não por acaso, Mario Draghi, hoje presidente do Banco Central Europeu e um ator importante no atual drama grego, era então o diretor da divisão internacional do Goldman."
A crise foi agravada anos atrás por uma
operação do Goldman Sachs, arquitetado pelo atual diretor-executivo do
banco, Lloyd Blankfein. Juntamente com a sua equipa, Blankfein ajudou a
Grécia a esconder a verdadeira dimensão da sua dívida e, no processo,
fê-la praticamente dobrar de tamanho. Da mesma forma como ocorreu na
crise do subprime americano, e que levou à atual situação crítica de
muitas cidades americanas, um empréstimo predatório de Wall Street teve
um papel importante na crise grega, embora pouco reconhecido.
Em 2001, a Grécia procurava maneiras de
mascarar os seus crescentes problemas financeiros. O Tratado de
Maastricht exigia que todos os membros da zona do euro mostrassem
melhorias nas contas públicas, mas a Grécia ia na direção oposta.
Então o
Goldman Sachs veio em seu socorro, oferecendo um empréstimo secreto de
2,8 mil milhões de euros, disfarçado de swap cambial não contabilizado –
uma operação complicada, em que a dívida da Grécia em moeda estrangeira
foi convertida em obrigações em moeda local, utilizando uma taxa de
câmbio fictícia.
Como resultado, cerca de 2% da dívida da
Grécia magicamente desapareceram das suas contas nacionais.
Christoforos Sardelis, então chefe da Agência de Gestão da Dívida
Pública da Grécia, mais tarde descreveu o acordo na Bloomberg Business
como “uma história muito sexy entre dois pecadores”. Pelos serviços, o
Goldman recebeu a soma colossal de 600 milhões de euros (793 milhões de
dólares), de acordo com Spyros Papanicolaou, que substituiu Sardelis em
2005. Isso representou quase 12% da receita da gigantesca unidade do
Goldman de trading e principal-investments em 2001 – que, aliás, bateu
recorde de vendas nesse ano. A unidade era dirigida por Blankfein.
Então, o negócio azedou. Após os ataques
de 11 de setembro, o rendimento dos títulos caiu, resultando em grande
perda para a Grécia por causa da fórmula usada pelo Goldman para
calcular o pagamento da dívida do país com o swap. Em 2005, a Grécia já
devia quase o dobro do que constara no acordo, fazendo a dívida não
declarada saltar de 2,8 mil milhões para 5,1 mil milhões de euros. Em
2005, o acordo foi reestruturado e a dívida fixada em 5,1 milhões.
Talvez não por acaso, Mario Draghi, hoje presidente do Banco Central
Europeu e um ator importante no atual drama grego, era então o diretor
da divisão internacional do Goldman.
A Grécia não foi a única a pecar. Até
2008, as normas contabilísticas da União Europeia permitiam que os
membros gerissem as suas dívidas através das chamadas tarifas fora do
mercado em trocas de moedas, estimuladas pelo Goldman e por outros
bancos de Wall Street. No final da década de 1990, o JPMorgan permitiu
que a Itália ocultasse a sua dívida trocando de moeda a uma taxa de
câmbio favorável, comprometendo assim a Itália a realizar pagamentos
futuros que não apareciam nas contas nacionais como obrigações futuras.
Mas era a Grécia quem estava em pior
situação, e o Goldman foi o maior facilitador. Sem dúvida, o país sofre
por anos de corrupção e evasão fiscal da sua elite. Mas o Goldman não
foi um espectador inocente: aumentou o seu lucro, especulando ao máximo
com a Grécia, assim como boa parte do mercado global. Outros bancos de
Wall Street fizeram o mesmo. Quando a bolha estourou, toda aquela
especulação deixou a economia mundial de joelhos.
Mesmo com a economia global a recuperar
dos excessos de Wall Street, o Goldman ofereceu à Grécia outro
artifício. No início de novembro de 2009, três meses antes de a crise da
dívida do país se tornar notícia mundial, uma equipa do Goldman propôs
um instrumento financeiro que prolongaria a dívida do sistema de saúde
da Grécia por muitos anos. Desta vez, porém, a Grécia não aceitou.
Como sabemos, Wall Street foi socorrida
pelos contribuintes norte-americanos. Nos anos seguintes, os bancos
tornaram-se novamente rentáveis e reembolsaram os seus empréstimos de
resgate. As ações dos bancos dispararam. Em novembro de 2008, uma ação
do Goldman era negociada a 53 dólares; hoje, vale mais de 200 dólares.
Os executivos do Goldman e de outros bancos de Wall Street têm recebido
enormes bónus e promoções. Só no ano passado, Blankfein, hoje
diretor-executivo do Goldman, ganhou 24 milhões dólares.
Enquanto isso, o povo da Grécia luta para comprar remédios e comida
Há situações análogas nos EUA, a começar
pelos empréstimos predatórios feitos pelo Goldman, outros grandes
bancos e empresas financeiras com que estavam aliados nos anos que
antecederam o estouro da bolha. Hoje, enquanto os banqueiros gozam as
férias nos Hamptons, milhões de americanos continuam a sofrer as
consequências da crise financeira, quando perderam empregos, economias
ou mesmo as suas casas.
Da mesma forma, cidades e estados
americanos têm sido obrigados a cortar serviços essenciais por estarem
presos a operações similares, negociadas pelos mesmos bancos de Wall
Street. Muitas destas operações envolvem swaps como o realizado entre o
Goldman e o governo grego. Assim como fizeram com o governo grego, o
Goldman e outros bancos asseguraram aos municípios que a troca de taxa
de variação cambial permitiria arranjar empréstimos mais baratos do que
se negociassem com taxas fixas tradicionais – enquanto, por outro lado,
minimizavam os riscos do negócio. Quando as taxas de juros desabaram e
os swaps acabaram custando muito mais, o Goldman e os outros bancos
recusaram-se a renegociar com os municípios, que tiveram que pagar
pesadas multas para encerrar os contratos.
Há três anos, o Departamento de Água de
Detroit teve de pagar ao Goldman e outros bancos multas num total de 547
milhões de dólares para encerrar swaps de taxas de juros desvantajosos.
Hoje, 40% do preço das contas de água de Detroit ainda vão para o
pagamento da multa. Moradores de Detroit cuja água foi cortada porque
não puderam pagar não têm ideia de que os responsáveis pela situação são
o Goldman e outros grandes bancos. Da mesma forma, o sistema
educacional de Chicago – cujo orçamento já foi cortado até ao osso –
deve pagar mais de 200 milhões de dólares em multas pelo encerramento de
uma operação de Wall Street que obrigava as escolas de Chicago a pagar
36 milhões de dólares por ano em swaps de taxas de juro.
Uma operação envolvendo swaps de taxa de
juro que o Goldman negociou com Oakland, Califórnia, há mais de dez
anos, acabou por custar à cidade cerca de 4 milhões de dólares por ano,
mas o banco recusou-se a encerrar o acordo sem que Oakland pagasse 16
milhões de dólares pela rescisão – levando os legisladores locais a
aprovar uma resolução para boicotar o Goldman. Quando, numa reunião de
acionistas, Blankfein foi questionado sobre o caso, explicou que romper
um contrato válido ia contra os interesses dos acionistas.
O Goldman Sachs e os outros bancos
gigantes de Wall Street são extremamente hábeis para vender operações
complexas, exagerando os seus lucros e minimizando os custos e riscos. É
assim que abocanham taxas gigantescas. Quando um cliente tem problemas –
seja este cliente um investidor americano, uma cidade dos EUA, ou a
Grécia – o Goldman esquiva-se e esconde-se por trás de formalidades
legais e dos interesses dos acionistas.
Os devedores que se encontram com
problemas raramente são irrepreensíveis, é claro: além de gastarem
muito, foram ingénuos ou estúpidos o bastante para embarcar na canoa do
Goldman. A Grécia criou os seus próprios problemas, assim como muitos
proprietários e municípios americanos.
Mas, em todos os casos, o Goldman Sachs
sabia muito bem o que fazia. Conhecia melhor os riscos reais e os custos
das operações que propunha do que aqueles que os aceitaram. “É uma
questão de moralidade”, disse o sócio na reunião Goldman em que se
abordou a situação de Oakland. Exatamente.
Artigo de Robert B. Reich, ex-Secretário do Trabalho dos EUA no tempo de Bill Clinton, publicado no jornal The Nation. Via Esquerda.net e As minhas Leituras, tradução de Clarisse Meireles para Carta Maior.