Gostaria
de convidar, quem tem a paciência de me acompanhar, para mirar com
alguma atenção, a funcionalidade e poder de intervenção de um
órgão-instituição do nosso sistema político, que é a
Procuradoria-Geral da Republica.
E esta análise, não será tão
árida como possa parecer, uma vez que ela nos proporcionará o
entendimento para perceber, a capacidade do poder executivo de poder
intervir de algum modo na esfera do poder judicial, o qual à partida
deveria estar totalmente bloqueado a fosse o que fosse, que pudesse
pôr em causa o direito garantido constitucionalmente, de total
independência e isenção na sua intervenção.
Será
de referir, a fim de se perceber bem da quantidade de poder que lhe é
conferido, que o Procurador-Geral da Republica, possui um conjunto de
poderes e competências centradas na sua pessoa, os quais exerce
quase unipessoalmente, embora devido à enormidade de tarefas,
delegue em regime de substituição a procuradores-gerais adjuntos de
confiança, uma boa parte da sua vasta intervenção.
Será
de sublinhar fortemente, que o lugar Procurador-Geral da Republica, é
um lugar de estrita escolha de confiança politica, promovida pelo
poder executivo, ou seja o governo, que propõe ao Presidente da
Republica a sua nomeação ou exoneração. Deste modo, a pessoa
ocupante de tal cargo, funciona na prática, como uma correia de
transmissão tutelar do poder executivo sobre o poder judicial.
Vejamos algumas prerrogativas do lugar….
Representação
do Ministério Publico, no Supremo Tribunal de Justiça, no Tribunal
Constitucional, no Supremo Tribunal Administrativo, no Supremo
Tribunal Militar e no Tribunal de Contas.
Sendo estes tribunais de recurso, na prática o dedo do governante em
exercício, tem a capacidade de influir directamente, e no seu
interesse, em qualquer decisão, sobre qualquer apelo ou assunto, que
chegue a julgamento nos citados.
E
todos sabemos, que há certos recursos, de certos processos, que são
condenados nos tribunais de 1ª e 2ª instância, e que nos supremos
são, senão absolvidos ou arquivados, pelo menos reduzidos na pena a
aplicar.
Requerer
ao Tribunal Constitucional a declaração, com força obrigatória
geral, da inconstitucionalidade ou ilegalidade de qualquer norma.
Como é possível,
uma instituição não eleita, possuir esta capacidade? Eu
compreenderia que um Tribunal, o pudesse requerer, agora sendo uma
entidade designada por um governo, poderá existir o perigo de a
Procuradoria-Geral da Republica, se tornar num peão de interesses
políticos inconfessáveis. Com a agravante, de fazendo parte também
do elenco de membros do Tribunal Constitucional, poder deliberar em
causa própria.
Promover
a legalidade democrática.
Esta é uma tarefa tão ambígua, quanto perigosa para a própria
democracia. Como é que um órgão não eleito defenderá a
legalidade democrática? O que é a legalidade democrática? Serão
um conjunto de princípios democráticos, que deverão ser aplicados,
em todos os actos relacionados com a justiça? Como se pode
centralizar numa figura, ainda por cima, directamente ligada ao poder
executivo, a defesa desta? Quem controla a qualidade desta
“promoção”? Quem garante, que à sombra desta, não se promovem
atropelos à citada legalidade democrática?
Dirigir,
coordenar e fiscalizar a actividade do Ministério Publico e emitir
directivas, ordens e instruções a que deve obedecer a actuação
dos respectivos magistrados. Informe-me
quem souber, sobre qual a possibilidade de interferência directa por
parte do governo, no decorrer normal da investigação e organização
de determinados processos, nomeadamente e como exemplo, aqueles
relacionados com a corrupção. Será ou não possível, que haja
investigações que sejam para avançar rapidamente, e outras que
sejam para arquivar rapidamente? Até que ponto, o poder executivo do
momento terá a capacidade, de interferir nas investigações em
curso? Até que ponto, o governo em funções, estará a par dos
meandros das investigações, violando desse modo o segredo de
justiça?
Fiscalizar
superiormente a actividade processual dos órgãos da polícia
criminal. Mais
perguntas difíceis. Em que consiste este fiscalização? Será
possível, que a fiscalização seja de algum modo tendenciosa? Será
possível, que os resultados das fiscalizações sirvam, de
instrumento de controlo e de pressão sobre as actividades dos órgãos
de polícia criminal? Até que ponto será possível, serem estas
fiscalizações, um serviço de controlo e censura, sobre todo e
qualquer aspecto que não interesse que chegue ao conhecimento dos
Tribunais propriamente ditos?
Inspeccionar
os serviços do Ministério Publico e ordenar a instauração de
inquéritos, sindicâncias e processos criminais ou disciplinares aos
seus magistrados.
Meu Deus!!! Não deveria ser uma entidade verdadeiramente isenta e
independente que deveria possuir estas prorrogativas? Porque é que
há-de ser um órgão, que está directamente tutelado pelo poder
executivo, que possui esta capacidade? Quem pode garantir, que os
magistrados, não são indevidamente pressionados, ou que são
indevidamente castigados se porventura forem demasiado zelosos em
relação a determinados processos?
Sou
um simples cidadão, que sabe ler, escrever e pensar. O que expresso
neste post são muitas dúvidas. Dúvidas de que haja alguém
suficientemente “santo” e “isento”, que ocupe este lugar de
tutela sobre a justiça, por nomeação partidária, e que consiga
assumir uma atitude imaculada e independente, face aos interesses
avassaladores daqueles que o puseram lá, para que os servisse.
por Octavio Serrano para o RiseUp Portugal