O DN lança a notícia da condenação de 3 donos de fábricas clandestinas na Catalunha (Espanha),
na semana passada, a três anos e meio de prisão pelo crime de exploração
laboral. Na Operação Wei, foram detidas inicialmente 77 pessoas.
A
polícia encontrou mais de 400 pessoas nestas pequenas fábricas
clandestinas. Trabalhavam de segunda a domingo, sem feriados e durante
15 horas.
Nas épocas de maior trabalho, cosiam até às três da manhã,
dormiam quatro horas e voltavam para as máquinas.
Dormiam em sótãos e
comiam esparguete e arroz. Não havia janelas nem condições de higiene.
E, por isto, ganhavam 25 euros ao dia, que serviam, em boa parte, para
pagar a dívida "contraída com a organização que os tinha trazido da
China".
O esquema foi descoberto em Junho de 2009
pela polícia catalã em 72 armazéns. A Operação envolveu 750
operacionais, incluindo 300 investigadores. Além das máquinas e das
roupas, a polícia encontrou uma "enorme quantidade de etiquetas" de
grandes marcas. E não eram simples falsificações - os códigos de barras
permitiram seguir o rasto das encomendas e chegar aos clientes finais,
"grupos comerciais da indústria têxtil, de notória relevância em
mercados nacionais e internacionais". Os investigadores destacam
etiquetas de marcas do El Corte Inglés - Easy Wear, Fórmula Joven ou
Hipercor - e da Inditex, a holding das conhecidas lojas Zara,
Stradivarius, Bershka, Lefties e Pull&Bear.
Parte das roupas à venda, até 2009, nas
prateleiras de algumas das grandes cadeias de moda espanholas, como a
Inditex e o El Corte Inglés, foram fabricadas pela máfia chinesa a
partir destas instalações clandestinas nos arredores de Barcelona. O jornal El País, teve acesso ao relatório judicial da
Operação Wei, que pôs a nu uma teia de subempreiteiros, em que cerca de
meio milhar de chineses, na sua maioria em situação irregular, eram
obrigados a trabalhar em condições de quase escravatura.
Nessas
fábricas clandestinas eram confecionadas roupas para 363 marcas e
retalhistas, entre elas empresas que estão no top da moda mundial como
Desigual, Punt Roma ou Cortefiel.
Os
grandes grupos (como sempre), não contratavam diretamente estas fábricas clandestinas e alegam desconhecimento da situação, remetendo a sua falta de responsabilidade para a assinatura de "códigos de conduta" por parte de fornecedores. Mas este caso que envolve empresas como a Cortefiel, Kiabi, Festa Moda, El
Corte Inglés e Inditex, não é único. E por parte de grandes empresas como estas, alegar desconhecimento deste tipo de situações é no mínimo desonesto.
Também esta semana a jovem Lucy Kirk, no Reino Unido, afirma ter descoberto uma carta dentro de umas meias que comprou no gigante Primark, para o pai. A carta, escrita em Mandarim, será de um homem de
39 anos, de seu nome Ting Kun Dinh, que viverá como prisioneiro, na
província de Anhui. Na carta, este explica que foi detido depois ter
sido acusado de “rapto”, a sua mulher foi internada “num manicómio” e o
pai “assassinado em 2014”. Tudo por culpa “da corrupção do Governo
local”.
Esta não é a primeira vez que uma mensagem de
ajuda é encontrada em produtos da Primark. Em Junho passado, recorde-se,
uma mulher encontrou um bilhete no bolso de umas calças e em que se
referia também a um alegado caso de escravatura numa prisão chinesa. Lembre-se que a mesma Primark era uma das principais clientes da fábrica que desabou em 2013 no Bangladesh. A polícia do Bangladesh acusou de homicídio 41 pessoas consideradas
responsáveis pela morte de mais de 1100 seres humanos no colapso desta fábrica
têxtil. Os acusados incluem o dono,
Sohel Rana, e vários oficiais do governo. Neste complexo eram fabricadas roupas não apenas para a Primark, mas para outras marcas a Mango ou a Benetton.
Mas o que é uma SweatShop ?
O termo Sweatshops (em português “Fábricas de suor”), é cada
vez mais usado hoje em dia. O próprio nome dá a entender que se
tratam de empresas envolvidas com a exploração extrema dos
trabalhadores. São caracterizadas por um salário abaixo do mínimo necessário à
sobrevivencia, pela ausencia de qualquer forma de garantia ou protecção laboral; pela exploração de crianças; pelas condições de trabalho
perigosas para a saúde ou por ameaças, e por abusos sexuais,
físicos e psicológicos.
As denúncias internacionais contra as Sweatshops crescem a
cada ano e mostram uma triste realidade na qual existem inúmeras
possibilidades para a exploração dos trabalhadores. São mulheres
forçadas a tomar contraceptivos e submetidas a testes de gravidez
periodicamente; trabalhadores expostos a substancias tóxicas, ameaçados e
demitidos em caso de protestos e impedidos de abandonar o trabalho por
meio de vigias armados.
Outra característica é que estas fábricas
normalmente estão instaladas em países pobres, principalmente na Ásia e
América Latina. As empresas previligiam a produção nestas regiões, pois a
regulamentação laboral é geralmente inexistente e os salários são
menores.
Apesar de estarem instaladas maioritáriamente nestes países, as Sweatshops também são comuns em países do leste Europeu e existem até mesmo nos Estados Unidos. De acordo com a ONG CorpWacht,
em Los Angeles, dois terços dos imigrantes que trabalham na confecção de
roupas não recebem o salário mínimo garantido pela lei. Os
trabalhadores em El Salvador envolvidos na produção de ténis, que nos
EUA custam cerca de 140 dólares americanos, ganham 24 cêntimos por cada sapato produzido.
Na China existe inclusivé uma expressão que designa a morte por excesso de trabalho causada pelas complicações de saúde que este tipo de situação pode causar: "Guolaosi", onde se estima que cause a morte a cerca de 600 mil pessoas por ano.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT)
estima que 250 milhões de crianças entre de cinco e quatorze anos de
idade exerçam algum tipo de trabalho nos países em desenvolvimento. Elas
são privadas de educação e de uma infância normal. Algumas ficam
confinadas e sofrem constantes agressões, sendo impedidas de retornar ao
convívio familiar.
Este tipo de situações são constantemente denunciadas, até ao ponto de na Noruega se ter feito uma série para a televisão onde 3 jovens noruegueses passam um mês no Camboja, a conhecer a realidade diária dos trabalhadores locais. A
série "SweatShop" mostra o impacto que os três sentiram ao viverem aquele tipo de rotina.
Contúdo, e apesar de todas as denúncias internacionais, marcas de roupas como a Primark, Zara, H&M ou Gap, assim como marcas de luxo como a Armani, Gucci, Prada, Dolce and Gabanna ou a Burberry, continuam a conseguir reduzir os seus custos, fazendo o outsourcing da sua produção, para onde se possa violar leis laborais, utilizando mão de obra semiescrava na produção.
Entretanto, empresas tão poderosas como as que vemos constantemente nos centros comerciais pelo ocidente fora e que dominam muitas vezes o espaço mediático publicitário de alguns dos maiores eventos e espaços mundiais, ou magnatas com os recursos de Amancio Ortega, fundador do grupo espanhol Inditex que detém as conhecidíssimas Zara,
Stradivarius, Bershka, Lefties e Pull&Bear, continuam a apresentar-nos o argumento de que não sabiam, ou não tinham forma de saber, onde as suas roupas são feitas, por quem, e em que condições. Claro que não sabem, claro que não endorsam, claro que não lucram nada com isso, claro que não lhes é conveniente ... é a globalização.
Joao Henriques para o RiseUp Portugal
fontes e links adicionais disponibilizados no texto